MOSCOU/SIMFEROPOL, Ucrânia, 7 Mar (Reuters) - O presidente russo, Vladimir Putin, rejeitou a advertência do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, sobre a intervenção militar de Moscou na Crimeia, afirmando nesta sexta-feira que a Rússia não pode ignorar pedidos de ajuda de cidadãos de língua russa na Ucrânia.
Depois de um telefonema de uma hora, Putin disse em um comunicado que Moscou e Washington ainda estavam distantes de um acordo sobre a situação na ex-república soviética onde, segundo ele, as novas autoridades tinham "tomado decisões absolutamente ilegítimas nas regiões do leste, sudeste e na Crimeia".
"A Rússia não pode ignorar pedidos de ajuda e age consequentemente, em plena conformidade com o direito internacional", disse Putin.
Guardas de fronteira da Ucrânia disseram que Moscou tem enviado tropas para a península do sul, onde as forças russas tomaram o controle.
Serhiy Astakhov, assessor do comandante da guarda da fronteira, disse haver no momento 30.000 soldados russos na Crimeia, em comparação com 11.000 antes da crise, baseados permanentemente com a frota russa do mar Negro em Sebastopol.
Putin nega que as forças sem a insígnia nacional que estão cercando as tropas ucranianas em suas bases estejam sob o comando de Moscou, apesar de os veículos terem placas militares russas. O Ocidente tem ridicularizado esta alegação.
O mais sério confronto leste-oeste desde o fim da Guerra Fria, resultado da derrubada no mês passado do presidente Viktor Yanukovich após violentos protestos em Kiev, se agravou na quinta-feira, quando o Parlamento da Crimeia, controlado por membros de origem russa, votaram pela adesão à Rússia. O governo da região marcou um referendo para o dia 16 de março.
Os líderes da União Europeia e o presidente dos Estados Unidos denunciaram o referendo como ilegítimo, dizendo que violaria a Constituição da Ucrânia.
A líder da câmara alta do Parlamento russo afirmou após se reunir com parlamentares da Crimeia, nesta sexta-feira, que a região tem o direito de auto-determinação e descartou qualquer risco de guerra entre as duas "nações fraternais".
Antes de ligar para Putin, Obama anunciou as primeiras sanções contra a Rússia desde o início da crise, ordenando a proibição de vistos dos Estados Unidos e o congelamento de bens de pessoas ainda não identificadas que seriam responsáveis pela ameaça à soberania da Ucrânia.
O Japão endossou a posição das nações ocidentais de que as ações da Rússia, cujas forças tomaram o controle da península da Crimeia, constituem "uma ameaça à paz e à segurança internacionais", depois de Obama ter falado com o primeiro-ministro Shinzo Abe.
A China, muitas vezes aliada da Rússia no bloqueio de movimentos ocidentais no Conselho de Segurança da ONU, foi mais cautelosa, dizendo que as sanções econômicas não eram a melhor maneira de resolver a crise e evitou comentar sobre a legalidade de um referendo sobre a secessão da Crimeia.
A União Europeia, o maior parceiro econômico e cliente do setor energético russo, aprovou um plano em três etapas para tentar forçar uma solução negociada, mas não chegou a impor sanções imediatas.
O Ministério das Relações Exteriores da Rússia condenou furiosamente a decisão da UE de congelar as negociações sobre o facilitamento de vistos como "extremamente improdutiva" e advertiu que Moscou iria retaliar em caso de sanções.
Bruxelas e Washington também se apressaram em fortalecer as novas autoridades na Ucrânia economicamente abalada, anunciando tanto a assistência política como a financeira.
As promessas de bilhões de dólares em ajuda ocidental para o governo de Kiev e a percepção de que as tropas russas não estão dispostas a ir além Crimeia para outras partes da Ucrânia ajudaram a reverter as perdas da moeda local.
Nos últimos dois dias, a moeda foi negociada acima de 9,0 em relação ao dólar pela primeira vez desde que a crise da Crimeia começou na semana passada. Comerciantes locais disseram que as restrições cambiais impostas em caráter emergencial na semana passada também beneficiaram a moeda.
DIFERENÇAS IMPORTANTES
Em seu telefonema, Obama disse ter pedido a Putin para aceitar os termos de uma solução diplomática sobre a Crimeia, que levaria em conta os legítimos interesses da Rússia na região.
Putin foi desafiador em relação à Ucrânia, afirmando que Yanukovich, pró-Rússia, havia sido deposto em um "golpe inconstitucional". Mas ele destacou o que chamou de "importância primordial das relações russo-americanas para garantir a estabilidade e a segurança no mundo", disse o Kremlin.
"Essas relações não devem ser sacrificadas por diferenças individuais, embora muito importantes, sobre os problemas internacionais", disse Putin.
Os 28 países da UE se reuniram com o primeiro-ministro ucraniano, Arseny Yatseniuk, para uma cúpula de emergência, mesmo Kiev não sendo um membro do grupo nem um candidato reconhecido para se juntar ao bloco. Ficou acordada na reunião a antecipação da assinatura das partes políticas de um acordo para a aproximação, antes das eleições de 25 de maio na Ucrânia.
Yatseniuk disse depois de voltar para a Ucrânia que ninguém no mundo civilizado iria reconhecer o resultado do "chamado referendo" na Crimeia. Ele reforçou a disposição de Kiev para negociar com a Rússia e disse que havia solicitado uma conversa telefônica com primeiro-ministro russo Dmitry Medvedev.
A Comissão Europeia disse que a Ucrânia poderia receber até 11 bilhões de euros (15 bilhões de dólares) nos próximos anos, desde que chegasse a um acordo com o Fundo Monetário Internacional, que exige reformas econômicas drásticas como o fim dos subsídios de gás.
Apesar das duras palavras de Putin, manifestantes que permaneciam acampados no centro de Praça da Independência de Kiev para defender a revolução que depôs Yanukovich disseram não acreditar que a Crimeia conseguiria permissão para se separar da Ucrânia.
Alguns disseram estar dispostos a ir à guerra contra a Rússia, apesar do descompasso entre as Forças Armadas dos dois países.
"Estamos otimistas. A Crimeia vai ficar conosco e vamos lutar por isso", disse Taras Yurkiv, de 35 anos, da cidade oriental de Lviv. "Como vamos lutar depende das decisões da nossa liderança. Se necessário, iremos com armas. Se você quer paz, você deve se preparar para a guerra."
(Reportagem adicional de Luke Baker e Martin Santa, em Bruxelas; Steve Holland e Jeff Mason, em Washington; Lina Kushch, em Donetsk; e Pavel Polityuk, em Kiev) Fonte: Yahoo Brasil